Mulher sobre triângulos azuis

“Sim, aqui me encontro despida, atravessada por essa tercina entre angústias, o tempo e nossas relações."

Três vezes foram os encontros:
No primeiro, segundo ele, fizemos amor degustativo.
Já o segundo nos engolimos.
A menstruação atrasada, a insegurança alarmista. Eu que normalmente sou racional, guardo esse medo de uma possível gravidez sozinha. Imaginando o futuro sempre nesse espaço azul. Frio e calculista.

Desta vez não me resguardei. Partilhei meus medos com ele sem saber ao certo sua reação.
Veja, eu tenho um filho. Que tem um genitor, mas que infelizmente não tem um pai. Repetindo a história da minha mãe, eu não soube escolher. Me imaginei sozinha com mais um.
Agora seríamos três? Eu caminhando na frente e meus dois filhos comigo atrás, como um triângulo instável. Entende minha angústia?
Surpreendentemente, durante todos os dias de preocupação, ele me deu suporte emocional em meio de um ritmo descompassado de Surtos cotidianos, choros e cálculos. Ritmo esse que cessou fazendo minha menstruação descer. Tudo passou com o…

Tempo.

No terceiro encontro, anos depois, ele me pediu para ajudá-lo em um trabalho. Disse que estava perdido e precisava de um encontro. Uma solidez em meio a ritmos de que segundo ele, eu conseguiria trazer.
Não sabia como ele me olharia. Se algum de nós sentiríamos atração depois de tudo que passou. Um abraço desengonçado. Ele me desmonta sendo humano. Sua risada tem o mesmo som. Meu dia estava ruim; ele me relaxa. A cerveja também. Uma confissão!
Dele. “Sabe quando você me falou que estava grávida? Pensei em largar tudo, deixar os hobbies, vender tudo e me dedicar àquela criança uma menina eu seria o pai que eu não tive. A base de um triângulo que sempre sonhei. Minha irmã rezava todos os dias para eu ter uma menininha. Eu cheguei a sonhar com a família, eu e duas meninas, como um triângulo estável, harmônico, sereno.”

Naquele momento eu senti algo que não sei nomear
Bem no meio do peito
não era dor mas sim um buraco intenso
diferente do espaço azul em que resido
Por um momento eu era quente e sensitiva.
Quiçá, expansiva.
Em matizes brilhantes, constrastes altos e gestos delicados
O ritmo desordeiro a minha volta se encontrou harmônico logo dentro de mim.
O tormento de outra hora, se tornou calmaria
Sim, aqui me encontro despida
atravessada por essa tercina
entre angústias, o tempo e nossas relações.

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